Num movimento sozinho Fechar a porta do quarto significa isolar-se Minar sua trincheira Demarcar seu território “Proibida a entrada de estranhos Este aqui é o meu local”
Num movimento sozinho Fechar a porta do quarto significa afirmar-se Proteger-se de qualquer ameaça E, de alguma forma, aquietar o coração “Cala a boca já morreu Quem manda aqui nessa porra sou eu!”
Já num movimento acompanhado Fechar a porta do quarto significa questionar-se Por que as pessoas surpreendentemente se transformam? E por que você não consegue gritar com o dedo em riste? Bradar em voz alta e sair correndo?
Num movimento acompanhado Fechar a porta do quarto significa calar-se É o tilintar da tranca que ressoa alto demais O toque no disjuntor também grita O escuro fala por si E me faz procurar na janela qualquer brechinha de luz
Quando fecham a porta do quarto Geralmente canto versinhos soltos, bem baixinho [é que, sabe, tenho medo de estragar o clima]:
"(...) Tão redonda a lua Como flutua (...) E no silêncio lento (...) Apaixonado (...) Que eu sei que embaixo desta neve mora um coração"
[São versos soltos assim mesmo, em elipse. O resto ainda não consegui lembrar]
***
"Não me deixe só. Eu tenho medo do escuro. Eu tenho medo do inseguro. Dos fantasmas da minha voz" [“Não me deixe só”, Vanessa da Mata]
O escuro eu já conheço. O medo também. Só não esperava recrudescer os fantasmas da minha voz. Preciso voltar a ficar afônico.
[Alguém, por favor, pode ler o post aí embaixo
e fazer a gentileza de me ajudar a abrir a porta?]
"Não quero falar com o culpado que confunde viver com fugir, esconder-se, 'proteger-se' do que ama (e do que o ama). Quero falar (porque o conheço, porque me comove, porque vem antes de tudo) com o inocente que aos sete anos (você aí tinha sete, não?) iluminava as tardes com sua curiosidade e cobria os sapatos de pó. Se ainda está vivo, se ainda está em algum lugar (e eu acho que sim, que está), que bata três vezes nessa foto, e eu vou lhe abrir a porta".
[Extraído do livro "O passado", de Alan Pauls, p.99]
Nesta pequena conversa registrada hoje, os personagens não quiseram se idenficar. Ainda não se têm pistas sobre o perfil dos envolvidos, mas há suspeitas de que sejam rivais. Escutas autorizadas revelam o teor dos diálogos.
– Olá, como vai? – Eu vou indo e você, tudo bem? – Tudo bem, eu vou indo correndo pegar meu lugar no futuro, e você? – Tudo bem, eu vou indo em busca de um sono tranqüilo. Quem sabe? – Quanto tempo... – Pois é, quanto tempo...
– Me perdoe a pressa. É a alma dos nossos negócios. – Qual, não tem de quê. Eu também só ando a cem. – Quando é que você telefona? Precisamos nos ver por aí. – Pra semana prometo, talvez nos vejamos, quem sabe? – Quanto tempo... – Pois é, quanto tempo...
– Tanto coisa que eu tinha a dizer, mas eu sumi na poeira das ruas. – Eu também tenho algo a dizer, mas me foge a lembrança. – Por favor, telefone, eu preciso beber alguma coisa rapidamente. – Pra semana... – O sinal... – Eu procuro você... – Vai abrir! Vai abrir! – Eu prometo, não esqueço, não esqueço. – Por favor, não esqueça.
– Adeus. – Adeus.
***
Sinal fechado.
Por enquanto, não consigo ver muito além
Do que as balas que põem no meu retrovisor: "Eu poderia estar matando ou roubando
Mas estou aqui pedindo. Preciso de ajuda.
Por favor, colabore com R$ 1"
O sinal abriu.
O vidro continua fechado.
A bala volta com tantas outras
para a caixa de papelão.
E eu sigo a poeira das ruas.
[Notapé: o diálogo acima foi feito entre a mente e o coração.
Em depoimento, eles afirmam que nem sempre andam em sintonia,
mas que um dia prometem se rever. Pra semana, quem sabe.
E a música é "Sinal fechado", de Paulinho da Viola]
Este tópico foge dos textos que vem sendo apresentados aqui, mas é por uma boa causa: ressaltar a iniciativa de uma escola de samba em abordar, no seu desfile, um personagem importantíssimo na interseção entre as culturas popular e erudita. Chama-se Mercedes Baptista, primeira bailarina negra do Teatro Municipal, que em 2008 será enredo da Acadêmicos do Cubango, pelo Grupo de Acesso A. O texto é de minha autoria e explica um pouco por que vale a pena, para mim, militar em prol do carnaval e das escolas de samba.
Mercedes Baptista: um passo de vanguarda no carnaval carioca
Sem muitas delongas ou rodeios: um enredo sobre Mercedes Baptista é de salutar importância para o carnaval carioca. A iniciativa da Acadêmicos do Cubango em evocar ao grande público a memória da bailarina negra traz à tona uma série de questionamentos que, imbricados, dão corpo e vida a uma reflexão sobre o atual modelo de desfiles das escolas de samba do Rio de Janeiro.
A começar pela importância de Mercedes na história do carnaval. Junto com os carnavalescos Arlindo Rodrigues e Fernando Pamplona, ela introduziu, em 1963, com o enredo “Xica da Silva”, a ala coreografada: a clássica cena do minueto dançado com a Candelária ao fundo (foto abaixo). Hoje, discute-se se a teatralização em alas ou carros alegóricos é ou não a nova tendência nos desfiles na Sapucaí. Mas, naquele ano, a vermelha-e-branca da Tijuca desafiou os cânones da época ao trazer Mercedes como coreógrafa do palco do carnaval, fruto de sua experiência como primeira bailarina negra do Teatro Municipal carioca. Mercedes Baptista é, portanto, protagonista de uma concepção artística inovadora para as escolas de samba.
Aliás, a década de 1960 é tempo de vanguardas no carnaval carioca – e o Salgueiro tem participação fundamental neste processo. Primeiro, por estabelecer o diálogo entre o erudito e o popular com a chegada de pensadores da Escola de Belas-Artes no desenvolvimento do desfile. Depois, por inverter a lógica temática vigente e fazer do negro a estrela principal, cantado, homenageado e reverenciado pelos foliões. Este era um desafio grande a ser vencido, pois a idéia de “um dia se tornar rei na folia” vigorara forte no imaginário dos desfilantes, que não se viam trocando os babados da fidalguia pela ráfia ou chapéu de palha. E, por fim, ao reconduzir aos anais da história personagens até então confinados nos autos e registros de sua época, como Xica da Silva (1963, na foto) e Chico-Rei (1964).
Quatro décadas depois, a Cubango faz valer o prenome “Acadêmicos” que carrega em seu pavilhão ao romper com o modelo de enredos vigente, que buscam no patrocínio uma forma de se enquadrar ao luxo e à ostentação que, infelizmente, designam uma “grande escola de samba”. Bom desfile e sinal de título precisam ter, necessariamente, luxo e dinheiro? Com o enredo “Mercedes Baptista: de passo a passo, um passo”, do carnavalesco Wagner Gonçalves, a verde-e-branca de Niterói desafia as cifras em prol de um enredo digno e merecedor de aplauso e reafirma-se como uma agremiação de força antes mesmo de pisar a Sapucaí.
Com “Mercedes”, a Cubango resgata ainda a tendência introduzida pelo Salgueiro nos anos 1960, ao hoje inscrever na memória popular a vida e obra da mulher que é muito mais do que a primeira bailarina negra a pisar no palco do Municipal. Só esse fato já vale o enredo. Mas Mercedes Baptista vai além do seu “pas-de-deux”: ela militou contra o preconceito racial; reafirmou sua origem africana fundando uma companhia de dança afro; e, como citado, levou a erudição dos palcos para a ópera popular do carnaval, com a vermelha-e-branca tijucana.
Em poucas palavras, a escola de Niterói resgata a nobreza do negro no carnaval, manifestação popular cujas raízes estão fincadas na herança cultural vinda do tempo dos escravos. Aí reside a importância desta iniciativa da Cubango. Assim como o Salgueiro na década de 1960, a escola se mostra moderna e de vanguarda, pois apresenta um enredo que não se restringe a apenas uma biografia. Dois mil e oito ainda não chegou, mas a Cubango já prova que, por maior que sejam as intempéries de um enredo autoral no Grupo de Acesso, é possível resgatar não só a nobreza do negro na Avenida, mas a própria nobreza de uma escola de samba. É, portanto, mais que um reencontro com sua própria história, marcada por enredos afros importantes como “Afoxé” (1979), “Fruto do amor proibido” (1981) ou “O fruto da África de todos os deuses no Brasil de fé” (2005).
Ano passado, o Salgueiro fez valer o lema das Candaces – “É preciso olhar pra trás para ir pra frente” – para resgatar suas origens ao contar a dinastia das rainhas negras da Antiguidade. O resultado não correspondeu às expectativas de muitos, mas o desfile reafirmou a importância da vermelha-e-branca enquanto uma grande escola de samba no carnaval carioca. Hoje, é a vez de a Cubango cumprir esse papel, também olhando para trás visando ao futuro: a inédita ascensão ao Grupo Especial.
Difícil não pensar em que espécie de sentimento virá à tona quando a terceira escola pisar a Marquês de Sapucaí. Mas esta é uma preocupação que deve ser deixada para o sábado de carnaval (2/2). Melhor fechar os olhos e se deixar levar pelo belo samba-enredo-homenagem-e-tributo à vida e obra de Mercedes Baptista, Candace contemporânea, atual Xica da Silva do carnaval carioca:
"Jubà Ìbamolé" Pro sonho dessa noite de magia Abra as cortinas, Oh! Municipal, Pra ópera do povo, o samba em sinfonia! Onde houver a fé, o axé dos orixás - vitória! Louvar a natureza, legado ancestral Negra e verdadeira herança cultural Viva em nosso carnaval
O violino com batuque do tambor "Corta-jaca", Mondongo... me leva! Ao "pás de deux" no jongo e entrechat no Congo Início de uma nova era
O alvorecer Dourava a corte em sua realeza Salve a academia tijucana Onde a negritude era nobreza A mãe do balé afro com os pés no chão Revela seu poder de sedução Vai acontecer, Florescer cultura popular Na força dos heróis do novo mundo A minha academia vai brilhar O tão sonhado passo avançar
Baila Vem fazer parte desta emoção Teu manto verde e branco é tradição Cubango, luz da minha vida Mercedes Baptista Divina tu és Ponho a Avenida aos teus pés
Composição de Arthur Bernardes, Sardinha, Diego Nicolau, Junior Duarte e Carlinhos da Penha. (Gravação não-oficial)
"Versos... não Poesia... não Um modo diferente de contar velhas histórias" [Cora Coralina]
Este é um pouco o espírito deste espaço: contar velhas histórias mirando novos horizontes
Não sei dizer se é um modo diferente de contar histórias Pelo menos, é sincero Mesmo que os sentimentos aqui expostos Não sigam uma ordem lógica ou coerente do pensamento
"Tudo isso é absolutamente independente da minha vontade"
[Fernando Pessoa]
***
A experiência, por ora, tem sido positiva Bom forçar-me a dizer o que sinto Mesmo que em entrelinhas ou em poucas linhas
[Alguém me pergunta: "A cada dia, uma nova descoberta?"]
Talvez sim, embora eu tema pelo lugar comum. Mas quem disse que a vida é sempre inédita ou livre dos chavões?
Por não encontrar resposta própria, Me ancoro no que já foi um dia dito:
"A espantosa realidade das cousas É a minha descoberta de todos os dias. Cada cousa é o que é, E é difícil explicar a alguém quanto isso me alegra, E quanto isso me basta" [ainda Fernando Pessoa]
De qualquer forma, a sensação tem sido positiva Ainda que as palavras soem um pouco pesadas É que eu ainda olho pra trás Querendo seguir à frente Mas, passo a passo, aos poucos Sinto que dá pra chegar lá
"Que importa a marca dos retratos na parede? Que importam as salas destelhadas, e o pudor das alcovas devassadas... Que importam? E vão fugindo do sobrado, aos poucos, os quadros do passado." [ainda Cora Coralina]
Vamos combinar: já estava mais do que na hora de começar a botar ordem nessa casa
Certa vez, meu pai disse: – Filho, às vezes precisamos ser um pouco burros na vida.
E ele tem razão Prepotência querer entender as vicissitudes do mundo Sem antes se dar conta da pequeneza da mente
"As coisas estão no mundo, só que eu preciso aprender" [Paulinho da Viola]
Maturar é difícil Sobretudo para os que se dão conta dessa missão tardiamente
"(...) Uma aprendizagem de desaprender" [Fernando Pessoa]
Prosseguir é preciso Viver também o é Mesmo com a sensação de ainda tatear a opacidade.
"A gente só sabe bem aquilo que não entende" [Guimarães Rosa]
Para mim, os vestígios do crescimento se deram Em cima, em decorrência ou em função de alguma dor Espécie de superação isolada, reclusa e não-compartilhada Porém, consciente e, de certa forma, renovadora.
“Dor não é amargura” [Adélia Prado]
As dores não foram suficientes para crescer? Talvez sim, embora espere pelas próximas com certa complacência Porque, no fundo, vou sempre estar insatifeito com a possibilidade perdida de um agir outro de um recomeço.
[droga poderia ter feito diferente por que eu não falei aquilo? agora foi tá falado já era deixa pra lá]
Reconheço minha condição imatura Por não conseguir desvincilhar-me Da eterna vontade de crescer De ter o mundo esclarecido Reconheço essa vã pretensão
Mas confesso que queria, por um dia Experimentar a sensação De um fruto num pomar Do grão verde até sua queda Sucumbido pelo tempo Que soube usar de paciência Para esperar pela apoteose da sua maturação final
[Que bela árvore essa a do jardim Parece centenária. Não é. Não sabemos a idade. Já estava aqui desde que nos mudamos pra essa casa.]
1ª) Pegar um livro próximo (próximo, não procure); 2ª) Abrir na página 161; 3ª) Procurar a 5ª frase completa; 4ª) Postar essa frase em seu blog; 5ª) Não escolher a melhor frase nem o melhor livro; 6ª) Repassar para outros 5 blogs.
Resultado:
"Rímini tendia a pensar no ciúme como numa máquina arbitrária, mas implacável, especializada em traduizir o idioma diáfano do amor para uma gíria de pesadelo: o amor fluía sem problemas até tropeçar numa impureza, a impureza formava dobra, a dobra gerava um efeito de funil, o fluxo do amor se afinava - e tudo se invertia e trocava de sinal."
"O passado", de Alan Pauls.
Crédito: Cartaz do filme "O passado", de Hector Babenco. Com Gael García Bernal. Participação especial de Paulo Autran. Estréia dia 26 de outubro.
Eu quero encontrar a aurora "A aurora da minha vida" Hoje, de uma outra perspectiva de vida: a que se esforça em se fazer querida em tempos de delicadeza que aos poucos se esvai
Não tenho mais saudades Da aurora de outrora Aquela que os saudosistas tanto evocam Talvez eu acho que ela ainda não tenha amanhecido Ou cessado meu crepúsculo Que insiste na indefinição de sua luz
[o dia ainda está claro mas logo vai escurecer vamos ver o pôr-do-sol? senta aqui acho que dá tempo]
Talvez não Ou ainda não O sol pode seguir o ciclo seu de cada dia Mas seu retorno, por ora, ainda não me é percebido
***
O sol põe-se diariamente E retoma seu posto inicial pontualmente Numa espécie de repetição renovada Atualizada (ou, pelo menos, uma tentativa de)
Mas às vezes a sensação é de que esse sol não retorna Talvez ele não siga a minha vontade Minha pretensiosa vontade de brilhar, raiar ou apenas fazer-se clarear ao meu bel-prazer Essa tem sido a sensação que ficou Da última aurora que me lembro da vida
[Desculpem-me os puristas Mas não consigo olhar pra trás e dizer:
"Oh! que saudades que tenho Da aurora da minha vida, Da minha infância querida Que os anos não trazem mais!"]
Eu quero mesmo é amanhecer uma nova aurora A minha aurora De qualquer maneira À minha maneira
Quero olhar da janela uma outra aurora Sem o seu ciclo ritmado de outrora Quem sabe até uma aurora imprevisível Para dar graça a uma vida já tão cheia de repetições
Quero começar uma nova aurora (vejam bem: "começar", antecedido pelo verbo querer que por sua vez, passa a ser conjugado por este quem vos fala) É que eu sou (ou quero ser) O mais novo responsável por essa aurora
E eu estou disposto A recuperá-la De qualquer maneira Repito: de qualquer maneira
nem que, para isso, seja preciso
recomeçar.
Escutando: Chico Buarque, "Acalanto para Helena" ("Dorme minha pequena / Não vale a pena despertar / Eu vou sair / Por aí afora / Atrás da aurora / Mais serena")
A velha casa abre aqui suas portas para o recomeço. Tudo começou diante de uma frase:
“O mundo ali tinha de ser de se recomeçar” É de Guimarães Rosa, em “Grande Sertão: Veredas”.
Ainda não consegui terminar o livro. Muito menos compreendê-lo em sua toda magnitude. Mas essa frase me interrompeu. De certa forma, ela rompeu também.
Recomeço. Ruptura. Regozijo. Revisita. Releitura.
Hoje eu quero recomeçar.
Perdão àqueles que passei e não dei a chance de continuar. Hoje eu quero consertar.
Falta coragem para mexer nas estruturas da casa antiga.
“O que ela [a vida] quer da gente é coragem”. [Ainda Guimarães Rosa]
***
velha casa. recomeço...
parece ambígüo? sim
contraditório? não sei.
coerente? talvez pra mim.
O primeiro passo para esse recomeço é abrir a porta da casa velha.
Talvez seja só a janela. Ou uma entrada sorrateira, nos fundos.