06 outubro, 2009

Eu não sei levar o amor de forma mambembe. Mas, por favor, não me faça de palhaço. Não me deixe acreditar que o relacionamento se constrói a dois quando, na verdade, você só pensa na sua lacuna – Onde estou? Por que não ligou? Quem, afinal, é o egoísta da história? Eu sei que estava aqui, na velha casa de sempre, cujo endereço já lhe é peculiar e em cuja entrada você nunca precisou de deferência. Bastava bater à porta. Eu só estava me arrumando para te receber da melhor forma que pude. Desculpe se demorei e não cheguei a tempo de lhe receber como devia. Tropecei no cadarço desamarrado. Me é muito difícil lidar com nós, você sabe. Tentei desatar alguns com você criando um outro “nós” – eu e você, embalados por músicas escolhidas, sentidas, lembradas, vividas, planejadas. Embalados por um sentimento compartilhado a dois. Ainda cheguei a tempo de te ver pelo olho mágico da porta: era de rosto largo, olhos ainda verdes prontos a dizer algo que a boca protelava em palavras. Não precisa me orquestrar o dicionário com suas lógicas e motivações. Eu já sabia de antemão que você chegou para se despedir. Apresentou-se a mim naquele mês em forma de ventania, sagrado ar que remexeu os papéis e móveis do meu quarto. Ainda vejo a desordem, e de certa forma a cultuo. Intuitivamente, talvez; é a fisiologia de juntar os cacos para ver se preenche a lacuna oca e embrutecida pelo tempo. Talvez nem faça muito sentido ocupar mais esse espaço, mas ainda me é necessário. O vento já passou por ele hoje e levou com ele o pouco da folha seca caída no chão. O pedaço de mato onde eu me escondia só por uns instantes, antes de me revelar por inteiro a você. Por ora, não existe mais ciranda aqui dentro. Só a batida perene de um coração que não aprendeu a desamar com um mero tchau.

5 comentários:

Dauri Batisti disse...

Essa coisa de desamar é tarefa árdua. Como se desama? Bem, o que importa é o texto, lindo.

Bom ver a casa atualizada.

Abraço.

Luna disse...

"Não precisa me orquestrar o dicionário com suas lógicas e motivações. Eu já sabia de antemão que você chegou para se despedir"


"Por ora, não existe mais ciranda aqui dentro. Só a batida perene de um coração que não aprendeu a desamar com um mero tchau."


Como alguem pode falar tanto assim, por alguem que nem conhece?

acho que todo mundo passa uma vez na vida[ou mais] pelas mesmas coisas.

ai ai, como dói.

Marcelo Mayer disse...

amar é constrangedor, vivenciar um é humilhante, por isso há de ter sempre meu cigarro comigo

Terceira Margem disse...

Como foi bom acordar e te ver tão perto de mim. Pude beijá-lo e tocar seu rosto.

Sabe, o melhor é que hoje, nesses oito ou cinco minutos que faltam, você abriu a porta [sorriso aberto], e se derreteu…

Envolveu-me e fez de novo moradia na casa que sempre esteve de portas abertas.

The Blues Is Alright disse...

Ah, l'amour... dá câncer na alma.