17 abril, 2009

A Nina


Nara Sales disse...
Ultimamente, eu tenho andado sempre por aqui. É tão sentimento, tão alma, tão livre. (...) Apesar de, ser uma "Velha Casa", restaura-se todos os dias.

 
Querida Nina,

Aqui é meu consultório. Já foi diário, semanal, mensal. Já fugi dele e agora estou às voltas na porta da velha casa, abrindo portas e janelas para entrar um pouco de vento. Vento. Movimento. Meus sentimentos me movem a escrever. Angústia de quem precisa desabafar, cuspir, desencapar o fio do curto-circuito. Não quero mais entrar em choque com o silêncio. Preciso falar. E aqui é meu espaço. Por isso nem a opção de parágrafo hoje (obrigado, Saramago). Não sou muito diferente do que esta tela de computador hoje nos faz distanciar. Não por opção (quisera eu): é que eu não sei mentir. Fica estampado, em néon, na testa. Mas me esforço em disfarçar o desconforto, seja comigo ou com alguém -- amigos, amores, família. A velha casa é como se fosse minha casa na árvore. E árvore, pra mim, tem sentido religioso -- símbolo de força, morada, caminho. Raiz. Solidez. Árvore é meu pai. Ele mora na velha casa. Minha mãe é um rio. Eu me transbordo na velha casa. Logo a velha casa é o que busco pra mim. Por isso, faço questão de renová-la. Nem que seja com um papel na porta, preso no prego enferrujado, cantando como Clara Nunes: "Vou morar no infinito / E virar constelação" -- lá fica meu sótão quando quero pedir cinco minutos do mundo. Penso que estamos sempre em fase de restauração. Minhas feridas não se cauterizam, porque estou sempre com o dedo nelas. Mas também só me permito cutucar. Hoje posso dizer que mais ninguém. Isso é restauração constante. É como lustrar a madeira sem fazer com que a madeira perca o cheiro de usada. É manter o sofá com o descolorido do estofado, ou servir a xícara com certa pintura desbotada.
[Agora talvez caiba um parágrafo]

"Eu sou assim, quem quiser gostar de mim, eu sou assim", me ensinou Paulinho. E assim, como disse num texto recente aqui, sigo a vida.
[Mais uma pausa educada para o gole do capuccino]

Seja sempre benvinda à velha casa.
Apareça quando quiser.

Um beijo,
Daniel

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