27 março, 2008

Luz apagada



Ontem cortaram a luz da velha casa. Falta de pagamento, falta de investimento, falta de cumplicidade ou responsabilidade. Falta de tudo um pouco, acusava o papel jogado no chão da porta.

Na caixa de energia esgarçada, estava lá o fio rompido que nos uniu por tanto tempo. Era um cobre já bem gasto, é verdade, sem muita resistência, por tanto esforço que um dia lhe fora desferido. Tudo para que nada, mas nada, absolutamente nada lhe faltasse naqueles tempos da tormenta.

Mesmo com a maré cinzenta, ainda mantínhamos o controle da proa. Agora, no escuro, o rubro que nos cobre a face já não reluz como antes, quando ele ainda surgia sorrateiro por debaixo do véu.

O branco dos nossos sorrisos não foi mais suficiente para alumiar a sala apagada. Nem a lua, tão companheira, ousou tirar aquela venda que nos tapava os olhos, ainda incrédulos com todo aquele constrangimento.

E as velas, necessárias nessas horas, eu confesso: eu as usei, todas, na minha romaria de meses, torcendo para que tudo se restabelecesse. Chamas em vão, orações em vão. São os corações que se vão agora, cada qual na sua encruzilhada do silêncio, sem rumo, sem interseção.


[Aos amigos da velha casa, peço desculpas pela ausência de posts e pelo tom triste desse texto. Não sou de me expor tão claramente aqui, mas hoje eu preciso dizer: não estou bem]


10 comentários:

[P] disse...

Então somos dois, moço Daniel: não estou bem também.

Mas preciso dizer que o texto ficou muito bom com o jogo de palavras que você usou...

Beijo.

ps: melhora o quanto antes, tá?

Renato Ziggy disse...

Daniel,

São os encontros e desencontros. Ainda assim temos duas pernas e podemos buscar energias em outras bandas (que valham a pena, claro!) para que a luz continue acesa.

Sem mais,
Zy

FlaM disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Anônimo disse...

Tristeza, silêncio, choro...
é justamente quando nos sentimos fragilizados que começamos a entender melhor qual é nosso lugar no mundo. Comigo pelo menos tem sido assim. Nessas horas a gente ouve mais o que o coração diz.
É que a vida costuma dar voltas e voltas para, muitas vezes, nos fazer entender coisas simples e de grande valor.

Meu desejo daqui é que tudo dê muito certo pra você, viu?

Descansa e deixa o coração pulsar num ritmo que te faça bem.
beijoo

Ana Damasceno disse...

Ol�!

Espero vir aqui animar-te embora possa perceber o ar que circula por aqui!
Seu texto � muito bom! E voc� tem fama de escrever bem... :)
tanto que foi indicado com o texto "Migalhas" � categoria de melhor texto no ENTRE VISTAS.

http://entrevistasvirtuais.blogspot.com/

Sauda�es � Velha Casa...

Ana

Anônimo disse...

Sabe, eu concordo com o Renato. Você leu o último texto que ele postou? Se não leu ainda, leia. Fala dessa possibilidade de enveredar por novos caminhos, mesmo com o coração, por hora, dolorido.
Cortes não são fáceis de serem vividos. E viver sem a luz que clareava nossos instantes é mais difícil ainda. Mas você tem uma luz própria, que pode até estar tímida, mas que tem muita força para brilhar.
E eu estou torcendo por você.

Receba, aí, o meu melhor abraço...

Beijos.

J.Machado disse...

Pois é caro amigo...acho que assim somos em vários. Faço de sua analogia, a minha.
As contas estão caras e por isso tantos cortes.
Agora o coração bate abafado, especialmente hoje, e coroei agora com a leitura de seu texto.
Peço desculpa ao seu leitor q porventura viesse ler esse meu comentário.
Pois bem...hj não estou nada bem tbm.
Melhoremos logo!

Anônimo disse...

Ô amigo, tb tô assim, sabia? Melancolia longa... olhar silencioso através das vidraças! Fica com meu abraço?

FlaM disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Filipe Garcia disse...

Da tristeza nasce coisas bonitas de se ler. A alma perturbada produz a arte.

Abraços