04 setembro, 2008

Caleidoscópios [ou "Dos Sonhos - Parte 2"]




Não tinha melhor hora para ele do que a hora de dormir. Era o momento em que o menino mais gostava do breu de seu quarto. Rapidamente se enfronhava entre os travesseiros, tapando os pés até a cabeça. Mas não pensem vocês que era uma reação sintomática ao medo comum a toda criança quando a noite chega. Os leões que moravam embaixo da janela? Ele não temia. Era um rapaz valente.  

Fechar os olhos, para o menino, simbolizava um momento mágico. Era mais do que hora de começar seu espetáculo de cada dia. A alma, mesmo de frente à sua cortina fechada para o mundo, se engrandecia a cada noite quando assistia aos acontecidos no palco montado sobre a cama. Diante dos olhos fechados do menino, caleidoscópios surgiam à revelia do grão mais fértil da sua imaginação.  

Formas e desenhos diferentes, tamanhos variados, todos numa escala cinza de cor. O céu, pela primeira vez, tinha nuvens próprias, assinadas pelo guri, que cerrava forte a visão para ver mais. Queria estrelas e borboletas voando juntas. Queria os feixes do arco-íris sem esperar o fim da chuva. 

Quem brilhava ali, como um sol em plena meia-noite, era a grafite que seus olhos insistiam em usar para os desenhos encantados. Toda noite era essa euforia. Festa. Hora de sonhar. Com os olhos, mesmo que fechados, bem abertos para ver passar o filme delirante de uma infância.

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