05 novembro, 2009

Terceira margem

Conta uma lenda iorubá que, para chegar ao Supremo, deveria-se perpassar antes por uma espécie de nove céus. Todos eram comandados por uma rainha, dona dos ventos e das tempestades. O dia estava claro naquele dia, mas a menina insistia em descobrir o que havia depois do azul. Olhava insistentemente para cima e nem se incomodava com a luz do sol batendo reta em sua vista. Queria porque queria ir mais longe só com o olhar. Era quieta e observadora a moça, mas não ia muito além na suas inserções com o céu. Chegava até à terceira margem, talvez, daquelas delineadas pelos ancestrais em priscas eras. O resto era só um clarão, que lhe embaçava os olhos tamanha a intensidade da luz vinda do alto. Passaram-se algumas horas, e a menina se cansou. Já era crepúsculo, o rosa pincelava a tintura azul do alto. Foi quando um sopro de vento cantou no ouvido da menina. Era a tal rainha. Feche os olhos, disse-lhe, no seu quarto. À noite eu a levarei para onde quer chegar. Eis o momento de atravessar todas as nove fronteiras que pairavam sobre sua pequenice e de contemplar a imensidão um dia desenhada em seu caderno. Ela e o Supremo se encontrariam nos sonhos e devaneios de quem só buscava uma explicação para a grandeza da vida. Nessa noite, depois de atravessar a tal terceira margem que tanto parecia limitá-la, a moça dormiu mais feliz do que de costume. Sentiu-se leve, como há muito não ousara se permitir.

3 comentários:

Marcelo Mayer disse...

a semana deveria ter 9 dias

Inês disse...

Que coisa bonita!
Não conhecia nada da cultura Yoruba, mas ultimamente tenho tido a graça de ter pequenos contatos, como esses mesmos da menina que olhava o céu e enchergava a terceira margem...
É um prazer imenso conhecer este espaço. Gostei das suas palavras!
Um abraço da nova companheira que vagarolando por aí encontrou você!

Dauri Batisti disse...

Compreender a grandeza da vida. Ela parece tão pequena!

Um abraço.